terça-feira, 18 de novembro de 2014

Geoengenharia propõe soluções para o clima: Ideias para combater o aquecimento global dividem especialistas

Manipulação do clima pode causar efeitos indesejados

Por HENRY FOUNTAIN
UTRECHT, Holanda - Para Olaf Schuiling, a solução para o aquecimento global está sob nossos pés. Schuiling, geoquímico aposentado, acredita que a salvação climática está na olivina, mineral de tonalidade verde abundante no mundo inteiro. Quando exposta aos elementos, ela extrai lentamente o gás carbônico da atmosfera.
A olivina faz isso naturalmente há bilhões de anos, mas Schuiling quer acelerar o processo espalhando-a em campos e praias e usando-a em diques, trilhas e até playgrounds. Basta polvilhar a quantidade certa de rocha moída, diz ele, e ela acabará removendo gás carbônico suficiente para retardar a elevação das temperaturas globais. "Vamos deixar a Terra nos ajudar a salvá-la", disse Schuiling, 82, em seu gabinete na Universidade de Utrecht.
Ideias para combater as mudanças climáticas, como essas propostas de geoengenharia, já foram consideradas meramente fantasiosas.
Todavia, os efeitos das mudanças climáticas podem se tornar tão graves que talvez tais soluções passem a ser consideradas seriamente.
A ideia de Schuiling é uma das várias que visam reduzir os níveis de gás carbônico, o principal gás responsável pelo efeito estufa, de forma que a atmosfera retenha menos calor.
Outras abordagens, potencialmente mais rápidas e viáveis, porém mais arriscadas, criariam o equivalente a um guarda-sol ao redor do planeta, dispersando gotículas reflexivas na estratosfera ou borrifando água do mar para formar mais nuvens acima dos oceanos. A menor incidência de luz solar na superfície da Terra reduziria a retenção de calor, resultando em uma rápida queda das temperaturas.
Ninguém tem certeza de que alguma técnica de geoengenharia funcionaria, e muitas abordagens nesse campo parecem pouco práticas. A abordagem de Schuiling, por exemplo, levaria décadas para ter sequer um pequeno impacto, e os próprios processos de mineração, moagem e transporte dos bilhões de toneladas de olivina necessários produziriam enormes emissões de carbono.
Muitas pessoas consideram a ideia da geoengenharia um recurso desesperado em relação à mudança climática, o qual desviaria a atenção mundial da meta de eliminar as emissões que estão na raiz do problema.
O clima é um sistema altamente complexo, portanto, manipular temperaturas também pode ter consequências, como mudanças na precipitação pluviométrica, tanto catastróficas como benéficas para uma região à custa de outra. Críticos também apontam que a geoengenharia poderia ser usada unilateralmente por um país, criando outra fonte de tensões geopolíticas.
Especialistas, porém, argumentam que a situação atual está se tornando calamitosa. "Em breve poderá nos restar apenas a opção entre geoengenharia e sofrimento", opinou Andy Parker, do Instituto de Estudos Avançados sobre Sustentabilidade, em Potsdam, Alemanha.
Em 1991, uma erupção vulcânica nas Filipinas expeliu a maior nuvem de gás anidrido sulforoso já registrada na alta atmosfera. O gás formou gotículas de ácido sulfúrico, que refletiam os raios solares de volta para o Espaço. Durante três anos, a média das temperaturas globais teve uma queda de cerca de 0,5 grau Celsius. Uma técnica de geoengenharia imitaria essa ação borrifando gotículas de ácido sulfúrico na estratosfera.
David Keith, pesquisador na Universidade Harvard, disse que essa técnica de geoengenharia, chamada de gestão da radiação solar (SRM na sigla em inglês), só deve ser utilizada lenta e cuidadosamente, para que possa ser interrompida caso prejudique padrões climáticos ou gere outros problemas.
Certos críticos da geoengenharia duvidam que qualquer impacto possa ser equilibrado. Pessoas em países subdesenvolvidos são afetadas por mudanças climáticas em grande parte causadas pelas ações de países industrializados. Então, por que elas confiariam que espalhar gotículas no céu as ajudaria?
"Ninguém gosta de ser o rato no laboratório alheio", disse Pablo Suarez, do Centro do Clima da Cruz Vermelha/Crescente Vermelho.
Ideias para retirar gás carbônico do ar causam menos alarme. Embora tenham questões espinhosas -a olivina, por exemplo, contém pequenas quantidades de metais que poderiam contaminar o meio ambiente-,elas funcionariam de maneira bem mais lenta e indireta, afetando o clima ao longo de décadas ao alterar a atmosfera.
Como o doutor Schuiling divulga há anos sua ideia na Holanda, o país se tornou adepto da olivina. Estando ciente disso, qualquer um pode notar a presença da rocha moída em trilhas, jardins e áreas lúdicas.
Eddy Wijnker, ex-engenheiro acústico, criou a empresa greenSand na pequena cidade de Maasland. Ela vende areia de olivina para uso doméstico ou comercial. A empresa também vende "certificados de areia verde" que financiam a colocação da areia ao longo de rodovias.
A obstinação de Schuiling também incitou pesquisas. No Instituto Real de Pesquisa Marítima da Holanda em Yerseke, o ecologista Francesc Montserrat está pesquisando a possibilidade de espalhar olivina no leito do mar. Na Bélgica, pesquisadores na Universidade de Antuérpia estudam os efeitos da olivina em culturas agrícolas como cevada e trigo.
Boa parte dos profissionais de geoengenharia aponta a necessidade de haver mais pesquisas e o fato de as simulações em computador serem limitadas.
Poucas verbas no mundo são destinadas a pesquisas de geoengenharia. No entanto, até a sugestão de realizar experimentos em campo pode causar clamor popular. "As pessoas gostam de linhas bem demarcadas, e uma bem óbvia é que não há problema em testar coisas em um computador ou em uma bancada de laboratório", comentou Matthew Watson, da Universidade de Bristol, no Reino Unido. "Mas elas reagem mal assim que você começa a entrar no mundo real."
Watson conhece bem essas delimitações. Ele liderou um projeto financiado pelo governo britânico, que incluía um teste relativamente inócuo de uma tecnologia. Em 2011, os pesquisadores pretendiam soltar um balão a cerca de um quilômetro de altitude e tentar bombear um pouco de água por uma mangueira até ele. A proposta desencadeou protestos no Reino Unido, foi adiada por meio ano e, finalmente, cancelada.
Hoje há poucas perspectivas de apoio governamental a qualquer tipo de teste de geoengenharia nos EUA, onde muitos políticos negam sequer que as mudanças climáticas sejam uma realidade.
"O senso comum é que a direita não quer falar sobre isso porque reconhece o problema", disse Rafe Pomerance, que trabalhou com questões ambientais no Departamento de Estado. "E a esquerda está preocupada com o impacto das emissões."
Portanto, seria bom discutir o assunto abertamente, afirmou Pomerance. "Isso ainda vai levar algum tempo, mas é inevitável", acrescentou. NYT, 18.11.2014.

quinta-feira, 13 de novembro de 2014

EUA e China anunciam acordo climático



Chineses se comprometem a desacelerar emissões antes de 2030, e EUA querem cortar 26% do seu CO2 até 2025


Nos EUA, acordo não precisa ir ao Congresso, mas republicanos, agora com maioria também no Senado, já reclamam
MARCELO NINIODE PEQUIM
Após meses de negociações sigilosas, China e EUA alcançaram um acordo sem precedentes para reduzir emissões de gases poluentes.
Tal feito deve energizar o esforço para concluir um acordo global sobre mudança climática em 2015.
O anúncio foi feito nesta quarta (12), na conclusão da visita à China do presidente americano, Barack Obama. Ao lado do líder chinês, Xi Jinping, Obama classificou o acordo como "histórico".
A China se comprometeu a atingir o ápice de suas emissões de CO2 no máximo até 2030, quando então elas deverão começar a cair. Para isso, o país pretende investir para que 20% de sua energia tenha origem em fontes não poluentes.
É a primeira vez que a China, país que mais polui no mundo, estabelece uma data para que suas emissões de CO2 parem de aumentar. Juntos, China e EUA são responsáveis por mais de 40% do dióxido de carbono emitido em escala global.
Os EUA, por sua vez, assumem o compromisso de reduzir as emissões em 2025 entre 26% e 28% em relação a 2005. A nova meta é mais ambiciosa que a estabelecida anteriormente por Obama, de um corte de 17% até 2020.
ACORDO GLOBAL
"Como as duas maiores economias e os maiores consumidores de energia e emissores de gases-estufa, temos uma responsabilidade especial de liderar o esforço global contra a mudança climática", disse Obama.
O anúncio permitiu um desfecho positivo para a visita de Obama à China, cercada por uma série de divergências e competição crescente entre as duas economias.
Ambos os líderes destacaram a importância do entendimento para encorajar outras grandes economias a chegar a um acordo ambicioso na 21ª COP (conferência mundial do clima) de Paris, em 2015 --antes disso, ocorre a 20ª COP, no Peru, no começo de dezembro deste ano, onde as bases desse acordo começarão a ser negociadas.
Xi Jinping disse explicitamente que o compromisso assumido pelos países serve para "assegurar que as negociações internacionais sobre as alterações climáticas irão chegar a um acordo".
No mês passado, a União Europeia também anunciou suas metas, comprometendo-se a reduzir em 40% as emissões até 2030, em relação a 1990. O bloco europeu é responsável por 11% das emissões mundiais de CO2.
Apesar do otimismo demonstrado por Xi e Obama, os dois líderes terão que vencer resistências domésticas para cumprir as metas.
Nos EUA, as recentes eleições legislativas deram o controle do Senado ao opositor Partido Republicano, que também aumentou sua maioria na Câmara.
O acordo não precisa passar por aprovação do Congresso, mas as críticas não tardaram. "Esse plano irrealista que o presidente empurrará para o seu sucessor vai garantir apenas impostos mais altos e menos emprego", atacou o líder republicano no Senado, Mitch McConnell.
A China tem obstáculos ainda maiores. Num momento de desaceleração, o governo tenta implementar reformas sem criar desemprego e instabilidade social.
Embora seja o país que mais investe em energias renováveis, a China ainda luta para diminuir sua forte dependência do carvão. Mais barato do que outras fontes de energia, ele gera 65% da eletricidade usada no país.
As metas anunciadas por Xi e Obama são importantes como um sinal de esforço conjunto, mas poderiam ser mais ambiciosos, diz Wang Tao, especialista em clima do Centro Carnegie-Tsinghua de Política Global.
"O compromisso com as metas é claro", afirmou à Folha. "O desafio é alinhar a preocupação de curto prazo com o crescimento econômico e a de longo prazo, que é preservar o meio ambiente." Folha, 13.11.2014.
www.abraao.com

Despertar dos gigantes ameaça protagonismo do Brasil na área

RAFAEL GARCIADE SÃO PAULO
Se o pacto climático entre China e EUA tiver o efeito previsto, os dois países devem deixar de travar as negociações do almejado acordo global. Nesse cenário, reduzem-se as chances de o Brasil seguir protagonista na área.
Na última vez em que chefes de Estado se reuniram para tentar chegar a um acordo, em 2009, o Brasil estava em ritmo acelerado de redução do desmatamento (sua principal fonte de CO2) e prometia reduzir até 39% de seu CO2 projetado para 2020.
A promessa deixava o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva à vontade para cobrar ação de outras nações. Seu discurso foi aplaudido como poucos durante aquele encontro em Copenhague.
Agora, porém, o país está numa condição diferente.
Mesmo que honre a promessa, o Brasil corre o risco de chegar à cúpula de Paris, em 2015, com as emissões em curva ascendente. E enquanto chineses e americanos falam em objetivos para 2030, o Brasil dá sinais de que repetirá sua intenção para 2020.
Ainda que o pacto sino-americano seja mais uma carta de intenções que um acordo vinculante e ainda que ele seja insuficiente para evitar um aquecimento global de 2ºC, considerado perigoso, a proposta chinesa de atingir 20% de energia renovável até 2030 é muito ambiciosa.

Enquanto isso, o Brasil, que tem hoje respeitáveis 40% de sua matriz energética (incluindo indústria e transporte) calcada em fontes renováveis, sinaliza uma aceleração do consumo de combustíveis fósseis. E não há como almejar um corte de emissões tão significativo quanto o chinês cuidando apenas do problema do desmatamento. Folha, 13.11.2014.