quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

Quase orgânicos: Em vez de terminar neste ano, permissão para o plantio de orgânicos com sementes tratadas com agrotóxicos terá prazo estendido

TATIANA FREITAS 
DE SÃO PAULO
Poucos consumidores sabem, mas a maioria dos alimentos orgânicos é produzida no Brasil com sementes convencionais que podem até receber tratamento com agrotóxicos.
E essa contradição, que tinha prazo de término no final deste mês, vai se estender por mais alguns anos.
Ontem, representantes do setor produtivo, das certificadoras e do governo, entre outros órgãos, concordaram em revogar o prazo previsto para a obrigatoriedade do uso de sementes orgânicas.
Hoje, o plantio com sementes convencionais é permitido caso o produtor comprove a indisponibilidade do insumo equivalente vindo de sistemas orgânicos. Pela legislação em vigor, essa prática seria proibida a partir de 19 de dezembro de 2013.
O problema é que a exceção virou regra, obrigando o governo a esticar esse prazo. O motivo: não existem sementes orgânicas em número suficiente para atender a todo o mercado, cujas vendas crescem em ritmo acelerado.
Segundo o coordenador de Agroecologia do Ministério da Agricultura, Rogério Dias, o objetivo do adiamento é adaptar a legislação à realidade do setor no país.
"Se as certificadoras cobrassem as sementes orgânicas, o agricultor seria impedido de produzir muita coisa, ficando limitado às sementes que ele mesmo consegue multiplicar", diz Luiz Carlos Demattê Filho, diretor industrial da Korin Agroindustrial.
Não foi definida uma nova data para que o uso de sementes orgânicas seja obrigatório --o texto final deve ser publicado no "Diário Oficial" nas próximas semanas.
A tendência é que a transição ocorra gradualmente e siga diferenças regionais. A partir de 2016, cada Estado poderá produzir listas de variedades que terão de ser obrigatoriamente orgânicas.
A diversidade de solo e clima entre as regiões do país dificulta ainda mais o cumprimento da norma.
Representantes do setor afirmam que, para chegar a um número de variedades que atendam a todas as especificidades climáticas e regionais em escala comercial, será necessário pelo menos uma década de pesquisa.
FALTA DE INTERESSE
Poucos agricultores conseguem utilizar as sementes orgânicas desenvolvidas por eles próprios. "É preciso investir muito, durante anos, para obter um bom resultado", diz Sylvia Wachsner, coordenadora do Centro de Inteligência em Orgânicos.
Alexandre Harkaly, diretor-executivo da certificadora IBD, diz que é comum encontrar falhas de germinação --importante veículo de doenças nas plantações.
Por isso, é necessário que o governo estimule pesquisas nessa área. A primeira ação com esse objetivo chegou atrasada. Apesar de a legislação prever a proibição do uso de sementes convencionais desde 2008, o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico lançou a primeira chamada para projetos de pesquisa em agroecologia há dois meses.
No setor privado, ainda há pouco interesse. "As grandes empresas não investem porque o mercado é muito pequeno em comparação com o total", diz Wachsner.
O mercado de hortaliças orgânicas hoje equivale a 2% do setor, segundo Warley Marcos Nascimento, chefe da Embrapa Hortaliças.
Até na estatal a prioridade é a agricultura convencional --carro-chefe das exportações brasileiras. "Dificilmente a Embrapa, ou outra empresa, vai desenvolver uma variedade exclusivamente para o cultivo orgânico."
Na UE, é obrigatório o uso de sementes orgânicas.
Fonte: Folha, 05.12.13

Líderes do agronegócio procuram Marina: 'Quando era ministra Marina não nos recebia, mas agora foi receptiva', afirma dirigente de entidade do setor

Produtores ficaram contrariados quando ela vetou a presença de Ronaldo Caiado na coalizão de Campos
DAVID FRIEDLANDERDE SÃO PAULO
Lideranças do agronegócio decidiram quebrar o gelo e buscar uma aproximação com a ex-senadora Marina Silva, hoje a aliada mais influente do governador de Pernambuco, Eduardo Campos, provável candidato do PSB à Presidência da República.
O aceno partiu dos dirigentes da SRB (Sociedade Rural Brasileira), entidade que congrega empresários de vários segmentos do agronegócio, e que sempre encarou Marina como inimiga de seus interesses. Na semana passada o presidente da entidade, Cesario Ramalho, procurou a ex-senadora durante um evento em São Paulo para um primeiro contato.
"Disse a ela que a gente precisa se aproximar, construir uma ponte entre o agronegócio e o meio ambiente", disse Ramalho: "Quando era ministra [do Meio Ambiente] Marina não nos recebia, mas agora foi receptiva. Ela precisa entender que não somos do mal, não somos devastadores de florestas".
OPÇÃO
O interesse no diálogo com Marina já existia, mas ganhou uma dimensão maior depois que ela se juntou a Eduardo Campos. Os ruralistas de São Paulo, tradicionalmente tucanos, têm mostrado simpatia pelo governador de Pernambuco.
Embora tenham se assustado com a presença de Marina ao lado dele, agora tentam estabelecer uma convivência pacífica com a ex-senadora porque acham que ela pode ajudar Campos a ser uma opção competitiva no ano que vem.
"A eleição para presidente passa pela Marina, isso não se discute", diz Ramalho. "Vamos conversar, mas não sei no que isso vai dar. Se ela tiver nossa confiança, poderá ter nosso apoio".
O grupo de Marina demonstra interesse no diálogo, mas ainda tem dúvidas quanto aos interlocutores com quem deve conversar. Politicamente, o setor rural é muito dividido, com predomínio de um grupo refratário a suas ideias, liderado pela senadora Kátia Abreu (PMDB-TO), presidente da CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil) e aliada de Dilma Rousseff.
Marina e os ruralistas divergem em vários pontos sobre a legislação que regula a preservação ambiental. Basicamente, ela acha as regras insuficientes, enquanto eles acham tudo um exagero.
Na votação do Código Florestal, aprovado em 2012, houve confronto porque ela trabalhou para que todos os desmatadores fossem obrigados a recuperar ou compensar os estragos que fizeram, mas os ruralistas conseguiram limitar o alcance da lei.
Os produtores rurais ficaram especialmente contrariados com Marina recentemente, quando ela vetou a presença do deputado federal Ronaldo Caiado (DEM-GO) no grupo de apoio à candidatura de Eduardo Campos.
O episódio forçou Campos a fazer uma peregrinação junto ao agronegócio para desfazer o mal-estar.
CAMINHO DO MEIO
"Ela tem as posições dela, nós temos as nossas. Vamos deixar o radicalismo de lado e procurar o caminho do meio", afirmou Gustavo Junqueira, conselheiro que deve assumir a presidência da SRB em 2014. O futuro dirigente, que pretende levar adiante o diálogo com a ex-senadora, acha que a tarefa é uma exigência dos novos tempos.
"O agronegócio brasileiro avançou muito nos últimos anos, e Marina, com o peso político que tem, pode nos atrapalhar ou nos ajudar muito. Ela tem reconhecimento internacional, pode abrir mercados importantes lá fora", disse Junqueira.
Fonte: Folha, 04.12.13